terça-feira, janeiro 03, 2006

Chamava-se Joana.

E estava estudando. Deveria estar, ao menos. Cumprir com suas obrigações de estudante de escola particular. Porém...

Ela, Joana, não concentrava-se. Olhava para a fria mesa de mármore, para a luminária na mesa (a estudante tinha problemas de vista), o prendedor de cabelo com alguns fios retorcido, um lápis, sujeira da borracha, e por fim seus olhos recaíam sobre o caderno. Folhas pautadas, linhas em branco. Sentimento de frustração.

Algumas vezes achava que não deveria ser, ou ter sido, humana. Seria tão mais fácil ser capim como Macabéa, pensava, não ter quereres por não saber o que é a satisfação de um querer, lógico é que, só se tem quereres ao passo que se tem algum desejo realizado. Mas de onde viriam os desejos se só os tem quem já teve a experiência de os ter realizado? Talvez haja apenas um desejo inicial, que vem conosco desde o momento em que o que temos - e sempre tivemos - nos é tirado. Sempre tivemos. Sempre é tempo demais.

Novamente encontrava-se perdida em seus pensamentos. Até que subitamente a porta se abriu bruscamente, ar frio, tensão e neblina invadiram o quarto. Um calafrio lhe percorreu a espinha, prendeu a respiração. A porta continuava aberta, a neblina entrava, o recinto estava cinzento. Olha para um lado, olha para o outro, olha para o chão, o teto... Começa a entrar em pânico, a respiração torna-se difícil, desespera-se, mas continua sentada, medo de se mexer, suando frio. Passos. Barulho de passos que ecoam pelo quarto. Muitos passos. Ouve "a coisa" andar ao seu redor, fecha os olhos, não quer ver nada, sente algo encostando em seu ombro, apertando-o. Joana grita, dá um pulo.


Abre os olhos, não há mais frio nem neblina, apenas sua mãe:
- Pára de dormir enquanto estuda, menina!

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